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Justiça Negocial e o Acordo de Não Persecução Penal

  • Foto do escritor: Andreza Jacobsen
    Andreza Jacobsen
  • 23 de set. de 2024
  • 4 min de leitura

Atualizado: 25 de set. de 2024



A justiça negocial no Brasil teve sua origem após o término da Ditadura Militar e, com a promulgação da Constituição Federal de 1988, buscou-se incluir no rol de direitos e garantias fundamentais a proteção do indivíduo enquanto parte do processo criminal. Mesmo diante da prática de condutas ilícitas, o sujeito deve ter resguardada a proteção contra arbitrariedades do Estado em seu dever de punir. As principais influências para a introdução da justiça negocial no Brasil incluem a decisão da Suprema Corte dos Estados Unidos em 1970 (Brady v. United States), as “soluções alternativas” praticadas por juízes e promotores no direito francês, formalizadas em 1993 por uma lei que instituiu a mediação penal, e os acordos informais no direito alemão, que foram incorporados ao Código de Processo Penal em 2009 (Strafprozessordnung — StPO).


A Constituição Federal de 1988, ao introduzir o princípio do devido processo legal em seu artigo 5º, inciso LIV, dispõe que:


Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: […] LIV - ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal;


Ademais, a Magna Carta de 1988, em seu art. 5º, inciso LVII, consagrou expressamente o princípio da presunção de inocência: “LVII - ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”. Este princípio, que estabelece o dever de tratamento ao cidadão acusado, passou a ser expressamente garantido, conferindo maior proteção àqueles sob investigação ou julgamento.


Diante de diversas influências e da necessidade de ajustar o processo penal brasileiro, foi introduzido o acordo de não persecução penal (ANPP) no ordenamento jurídico nacional por meio da promulgação da Lei n. 13.964/2019, conhecida como “Pacote Anticrime”. Este projeto de lei, inicialmente proposto pelo ex-ministro da Justiça e Segurança Pública, Sérgio Fernando Moro, foi fortemente influenciado por uma proposta anterior do ministro do STF Alexandre de Moraes, que visava a alteração de artigos do Código de Processo Penal.


O ANPP está vinculado ao instituto da justiça criminal negocial, inspirado no modelo norte-americano de Plea Bargaining e já conhecido em normas internas do Ministério Público pelas resoluções 181/2017 e 183/2018 do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP). O acordo de não persecução penal opera como uma medida despenalizadora, ampliando a justiça negocial no campo do Processo Penal, em consonância com outros institutos previstos no ordenamento jurídico brasileiro, como a transação penal e a suspensão condicional do processo, dispostas na Lei 9.099/95, além da delação premiada, presente na Lei 12.850/13. O reforço da aplicação do ANPP promove o consenso na política de resolução de conflitos penais no Brasil, permitindo a instituição de uma autêntica justiça criminal negocial no ordenamento jurídico pátrio, diante das inovações legislativas trazidas pela Lei n. 13.964/2019. O objetivo é a busca pela economia processual, onde o investigado confessa “formal e circunstancialmente” o crime e se compromete com medidas de reparação do dano (artigo 28-A e incisos do Código de Processo Penal). Em contrapartida, o Estado se abstém de processá-lo, e o delito não gera os efeitos típicos de uma condenação.


Conforme assevera Diogo Abineder Ferreira Nolasco Pereira, “verifica-se haver uma afeição à realização de tratamentos de autocomposição no seio dos processos judiciais, seja pela conciliação ou mediação, seja pela indução para que o Poder Judiciário intervenha na resolução extrajudicial, consolidando-a”. Todavia, a Resolução 289/2024, publicada pelo Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) em 25 de abril, prevê as consequências para casos de não cumprimento do Acordo de Não Persecução Penal. Caso o investigado descumpra os termos do acordo, a resolução permite que a confissão, condição essencial para o acordo, seja utilizada pelo Ministério Público como base para uma eventual denúncia.


Em teoria, isso significa que, se o investigado deixar de “reparar o dano” (inciso I, artigo 28-A do CPP) ou de “cumprir outra condição indicada pelo Ministério Público” (inciso V, idem), poderá enfrentar uma ação penal na qual já confessou, resultando em provável condenação. Em suma, o ANPP tem caráter negocial, mas ao Estado também é conferido o dever de não permanecer inerte diante de fatos que possam se repetir. Trata-se de uma via de mão dupla. A grande importância conferida ao acusado é o respeito às garantias do devido processo legal e da presunção de inocência; contudo, o processo impõe ao autor do delito o cumprimento das condições do ANPP, enquanto o Estado se assume como guardião dos termos desse acordo. A violação das cláusulas do ANPP autoriza o Estado a adotar medidas mais rigorosas em relação ao autor do delito.


Núcleo Científico Interno (NCI)


Dra. Andreza Jacobsen

Dr. Edmundo Rafael Gaievski Júnior



REFERÊNCIAS



FALCONE, Mathias; NOGUEIRA, Túlio Guilherme; DRUMMOND, João Pedro.O negociável e o inegociável no acordo de não persecução penal. Conjur, 2024. Disponível em: https://www.conjur.com.br/2024-mai-31/o-negociavel-e-o-inegociavel-no-acordo-de-nao-persecucao-penal/. Acesso em: 23 set. 2024. 

 
 
 

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